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DAMÃNI

  Eu pensei que pudesse manter o mal distante. Mas como pode ser isso, quando há um chamado t?o poderoso para ele?

  Anael o reconheceu de imediato. Era o mesmo anjo que, conforme os relatos de Bhantor, Theliel, Amonet e Gadhiel ficava no controle da entrada no céu.

  Ele era alto, majestoso, o corpo esguio, a pele clara, olhos de um azul de um céu profundo, os cabelos brancos e longos amarrados como uma crina, a bata longa aberta até a altura do quadril, mostrando uma cal?a também branca. E havia aquela espada que irradiava uma brancura leitosa. Seus modos eram imperiais, apesar de gentis.

  Assim que eles surgiram e pararam na entrada do local, ele pareceu despertar de seus pensamentos. Devagar ele tirou os olhos dos escombros e os examinou. Havia uma tristeza sentida neles.

  Sem pensar Layla se atirou para frente em dire??o ao anjo, que n?o demonstrou qualquer desagrado pela aproxima??o da dêmona, para alívio dos seus amigos.

  Ao contrário, com um sorriso compreensivo e confortador a encarou.

  - Por favor – pediu Layla, tomada de dor, parando trêmula à sua frente. – Você sabe onde ele está, sabe como ele está? – implorou, a voz um pouco estrangulada, as m?os trêmulas esticadas para ele como um tocante pedido.

  - Talvez – ele respondeu, tomando com grande carinho em suas m?os as de Layla, suadas de dor. - Mas você, realmente, sabe o que ele é? – perguntou sem tirar os olhos da dêmona, sem contudo ignorar a aproxima??o dos outros.

  - Eu sentia o que ele é. N?o me enganei sobre seu valor.

  - Que bom que acredita nisso – falou, libertando as m?os dela.

  - N?o devo acreditar, ent?o? – gemeu, esfregando as m?os uma na outra. – N?o devo acreditar em sua... honradez, em sua bondade? N?o devo acreditar na sua capacidade de doa??o, no amor que pode desprender, mesmo para aqueles que n?o o merecem?

  O anjo suspirou pesado. Com um gesto dos escombros trouxe muitos bancos, num deles se sentando, e convidando os outros para se sentarem com ele.

  - Sim, nesse deve acreditar, minha querida. E esse ser, que descreveu t?o bem, é chamado Gadhiel. Mas, temo que Gadhiel tenha morrido.

  - N?o, isso n?o é possível.

  O anjo suspirou profundamente, outra vez. Layla o observou, for?ando-se a se recompor. E foi ent?o que percebeu que o ar que o cercava era muito parecido com o ar de uma suprema derrota.

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  > Você o conheceu com muita proximidade, n?o conheceu?

  - Isso é verdade... Eu sou, ou era, da família de almas dele – revelou, para surpresa de todos. – Meu nome é Ovandriel.

  Ante o imenso silêncio que se instalou o anjo continuou:

  > Somos dos primeiros com que o UM aspergiu o vazio, os primeiros a semear os imensos vazios com constru??es, que se tornaram galáxias, sistemas, planetas... E as civiliza??es come?aram, e eram puras, e nos dava muito prazer. Mas, o UM nos havia lan?ado para que pudesse experimentar o que fora construído. E alguns de nós baixou a vibra??o, e mais e mais, e cada vez mais baixo, até que os dem?nios apareceram, e nos ajudaram a conspurcar ainda mais o que fora criado com tanta ingenuidade, felicidade e amor.

  > E as sementeiras escuras fecundaram e se espalharam pelos universos, e civiliza??es foram destruídas, e outras levantadas na dor e no medo, e planetas e sistemas desapareceram, e mais dor e medo se espalharam.

  O anjo parou a narrativa, os olhos tristes e pesados abandonados nas paredes queimadas e tomadas de imensas trincas.

  > Mas, havia alguns de nós que n?o aceitaram toda essa maldade e destrui??o, e por nós mesmos abandonamos o amor descompromissado e nos tornamos guerreiros, cada vez mais duros, mais ciosos do que chamávamos de justi?a, cada vez mais transtornados, e cada vez mais raivosos e violentos, t?o intensos que confundido com frieza se viram. E mais terríveis ficávamos, ao vermos que, quanto mais guerreávamos, mais o mal parecia se fortalecer. Foi assim também, com um grupo que foi chamado de tardischs, que também assim se perderam.

  O anjo pareceu ficar olhando algum ponto além daquele tempo, em uma outra dimens?o.

  > O UM nos mostrou nosso engano. Magoado ele enviou um arquianjo, e terminou com a guerra demoníaca, prendendo os três principais dem?nios – relatou.

  > Ent?o, muitos de nós repensamos o que fazíamos, e descobrimos que, se n?o houver a completa queda na experiência, o seu desejo n?o satisfeito vai continuar recriando-o, nos fazendo entender, por fim, que só o amor pode fazer essa completude.

  > Por isso, nessa compreens?o dolorosa que muita dor nos trouxe, entendemos que tínhamos que cair, para assim aprender como vítima o que n?o aprendemos como justiceiros.

  > Mas, havia um que n?o acreditou nisso. Ele era muito forte, muito poderoso, e a injusti?a e a falta de amor lhe doíam em demasia, o que o obrigava ao confronto, o que o obrigava a tentar trazer à raz?o o que estivesse perdido, n?o aceitando a própria perda.

  - Gadhiel – gemeu Layla. Abandonada no relato e em sua dor n?o percebeu, mas a essência de que era, uma neblina cinza se revolvia triste e abandonada à sua volta, tornando a vis?o ainda mais comovente e triste.

  - Sim, ele mesmo. E seu nome era Dam?ni.

  - Ent?o... Mas, por que ele n?o pode mais ser Gadhiel? Há algo que o obriga a ser Dam?ni? – perguntou totalmente confusa e perdida, os olhos abatidos presos nos olhos de profundo azul do anjo.

  - Porque, minha querida, ele n?o se tornou Gadhiel por evolu??o própria, por escolha própria... – revelou, levantando-se dentro do imenso silêncio pensativo que se instalara.

  - Mas, como pode ser isso? Quem pode ter...

  Layla, os modos meio assustados com o que vinha em sua mente, foi se erguendo lentamente, os olhos presos nos olhos do anjo. Ent?o se voltou para os seus amigos, para ver se havia entendido corretamente a insinua??o do anjo. E estava ali, a mesma desconfian?a em todos eles.

  Layla se voltou pesarosa para o anjo, apenas para descobrir um vazio acabrunhado no ar, um peso nos olhos azuis.

  Quando ele desapareceu daquela caverna, o silêncio pesado ainda persistia.

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